“Todos os sonhos que ele tinha, dos doces aos amargos,
Da razão pela vida á entrega aos pecados,todos intensos
Como a própria realidade, todos isentos da falta de
Veracidade”
E então ele se levanta do chão e começa a caminhar pela floresta tentando encontrar um caminho que faça com que volte a tempo para cidade. Já não se importava mais com o gorro que fora perdido no bosque das árvores secas e nem os animais que lhe ameaçaram.
− Como se já não bastava, ainda tenho que te seguir para que fiques sempre bem.
Era a voz que vinha do nada, vinha na cabeça dele, ecoava pelas pedras da montanha, pela cascata de água doce que se arrastava aos pés.
−Se me queres bem que me diga o caminho.
−Se chegou até aqui sozinho, terá a capacidade de encontrar por si só.
Já não bastava tudo, ele ainda havia de aguentar até as injúrias dos seus próprios seres imaginários. E ali estava a resposta. Se ele era capaz de aguentar isso tudo sem pestanejar já teria sim consciência suficiente para se libertar das amarras do passado, retornar ao seu estado líquido, sem medo de nada, sem receio de causar dor, ele sabia que era sua hora de se entregar aos verdadeiros sentimentos. Hora de encontrar com o senhor dos sonhos. E ele estava na cidade, deveria voltar.
≈ ─ ≈
Mas na cidade todos tem medo de duendes, será difícil encontrar um homem capaz de induzir o duende ao sono de Zeus. O sono que fará enxergar o que o futuro aguarda, qual será o próximo universo que sua alma irá caminhar. Não há tempo para remoer as dificuldades, e a primeira, ainda era encontrar o caminho de volta. Ele resolve seguir o curso das águas que percorrem pelos seus pés, talvez ao sul esteja o caminho. Andando pela floresta ele remoia memórias em sua cabeça, relembrava histórias, pessoas que estavam guardadas em algum lugar pois duende não ama com o coração, duende ama com a sinestesia universal, ama com alma. Era nesses momentos de lembranças dolorosas que ele olhava para o chão e assim avistou um cristal amarelo escondido entre a grama rasteira, se lembrou da carta que recebera quando ainda era pequeno, recebera dos céus:
“ (...) E por um golpe do destino, será brutal, encontrará a dor e se estranhará com o desconforto, vai caminhar pela terra dos homens, será como eles, caminhará como eles, verá suas cores, sentirá seus sabores, vai perecer aos instintos do amor e da vaidade, vai conhecer inglórias e terá o dever de registrá-las em histórias (...) Terás que passar por cada etapa da vida, começando do nascimento até a morte, terá que amar, sofrer, temer e revolucionar, deverá mudar a cabeça do mundo para que haja compreensão, Vai perceber sofrimentos que não são seus, Vai se esvair da nobreza que lhe confere.(...)”
Essa é hora que se pensa em como cruzar um rio sem ter uma ponte, Mas não há ferida que não se cure com o ardor do consentimento. Ele sabia que todas as provações que lhe cabiam eram para um bem maior, incompreensível agora em estado de indução humanoide. Os humanos não sabem pra onde vão, estão parados no tempo que criaram só porque as coisas na natureza acontecem repetitivamente. Eles reclamam tanto da rotina mas são escravos da Constancia.
Eis a parte da carta que realmente interessava no momento:
“ (...) E um dia quando estiver só, quando deixar teu berçário, quando for a hora de conhecer toda a fragilidade do mundo, de se apavorar com as sombras negras que povoam a alma de muitos, de se chocar com os homem-rato debaixo das pontes de concreto. (...) Verás assim o desprezo de toda raça. Verás o sangue, e o ser fétido, porém encontrarás o bem equivalente, Vai descobrir o que é a união de dois polos coexistentes de energia cósmica. (...)
E é isso que precisará entender e conhecer, é o que nunca lhe foi apresentado em outras vivencias, essa é a hora. Vai saber o que é quando encontrares uma pedra amarela (...)
E um estampido de esperança comoveu até as plantas que floresceram num instante, As rosas brancas transferiam a luz da lua até o cristal, que reluzia o cominho de volta até as montanhas de concreto. Ele andou por alguns minutos e caiu no sono.
≈ ─ ≈
Acordou em casa, sentiu o calor do suor escorrendo no corpo, jogou o cobertor no chão, acendeu um cigarro, olhou se haviam mensagens no celular, respirou profundamente. Se sentou apoiando a cabeça nos joelhos, Se concentrava em coisas boas, foi no amarelo do sol apontando no canto da cortina negra que cobria a janela que ele recordou que o senhor dos sonhos estava próximo. “Talvez seja em forma de animal” pensou “ um cachorro ou um gato.” Ele gostava muito de gatos.
Mas não era um animal o senhor dos sonhos. E isso ele descobriu depois... Não por uma pedra amarela, por uma pedra negra. A cor que não refletia nada, o avesso da clarividência dos tons claros.
(Ouro Preto 2011 Para "Tom" Eterno amigo)
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