Diversas vezes pensei em desistir dessa historia toda de ser escritor, escrevi para o teatro, passei pelo cartão de natal até chegar ao obituário de um jornal fudido que circula na Praça Sete, inferno, em um desses meus dias de desistência efetiva vi uma portinha simples que levava á um café pequeno, decoração de péssimo gosto, sem ventilação alguma, balcão empoeirado, luz de tungstênio de má qualidade, vestígios de uma decoração em que um dia o contraste de vermelho com roxo era tendência.
Sentei-me em um canto vadio, bagunçado, entre as traças vi companhia, aos poucos aquele lugar foi me conquistando e todos os dias antes de ir para o inferno eu me sentava e tomava um café, forte porém formigando de doce, frio, mas eu também sou, não julgarei o comportamento do café.
Certa vez entrou uma mulher, bonita, na mão esquerda marcas de uma aliança que não existe mais, punho e antebraços manchados de tinta azul e amarela, olhos cansados pelas leituras noturnas, cabelo mal arrumado, ela provavelmente preferia engolir livros de historia da arte do que perder tempo com sua aparência. Ela sentou, pediu um café, sorriu. Fiquei distraído escrevendo esse trecho que não reparei ao certo se ela terminou seu café antes de ir embora ou se petrificou em um canto como eu.
Certa vez entrou um homem, aparência robusta, olhos vermelhos marcados pelo baseado da manhã, mãos tremulas, bebeu uma água, pelos chinelos e os dedos empoeirados provavelmente não tinha dinheiro para mais nada, não é fato, estou julgando, até os escritores mais decadentes tem liberdade de serem idiotas, devia ter lhe oferecido um café mas ele foi embora de repente, não tive a chance, não tive tempo nem para um sorriso.
Certa vez passei pela porta e o café estava fechado, um papel dizia “ vigilância sanitária” não terminei de ler o resto, na minha cabeça aquilo soava como um “mais dia ou menos dia isso ia acontecer” achei engraçado como aquilo para alguém significava muita coisa e nada para mim apesar daquele lugar já fazer parte da minha rotina, sou sádico, não bebi café e nem sorri, me sentei na calçada e respirei fundo, fumei um cigarro e fui para o inferno em seguida.
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